O que muda no Movimento Estudantil com Temer na presidência?

Leia o comunicado em pdf

1. Desde o início do processo de impeachment já havíamos avaliado mudanças na dinâmica de frações do movimento estudantil brasileiro (“A falsa polarização e as suas consequências para o movimento estudantil” e “Construir a Greve Geral de estudantes na UESPI”, textos disponíveis em nosso site) que se cumpriu com a aprovação do pedido de impedimento do governo Dilma/PT e a posse do governo Temer/PMDB. Seu governo pouco difere dos planos do governo Dilma, como demonstra o comparativo das plataformas econômicas nas quais ambos se apoiam: Dilma, na Agenda Brasil, e Temer, na Ponte para o Futuro. As duas plataformas defendem a dinamização da economia brasileira objetivando lucros, propondo cortes na saúde, educação, modificações das leis trabalhistas, fim do licenciamento ambiental para empresas nacionais e estrangeiras, assim como a retirada de territórios indígenas, pescadores, camponeses e de outras comunidades tradicionais para o agronegócio/construção civil.
2. Diante desse quadro, o governismo [1] (PT/PCdoB/UNE/UBES/LPJ/UJS/etc) tenta voltar às suas bases, com grande resistência, e adota um duplo discurso: De que está sendo alvo “da direita”, e que é “radical”. Para fomentar o primeiro, aponta o 'golpe' que o Governo Dilma sofreu, embora até pouco tempo atrás tenha feito conchavos com os setores 'golpistas', e mesmo em meio 'ao golpe', por exemplo, manteve-se ao lado da ministra Kátia Abreu, baronesa do agronegócio brasileiro. Dando corpo ao segundo, convoca suas bases para realizarem atos, “ocupações”, oficinas de cartazes e pichações convocando uma "revolução já". É peculiar que utilizem o símbolo do anarquismo nessas intervenções, como na UFPI de Teresina, para atrair os setores desorganizados, mas ultracombativos, para a defesa do governismo, "contra o golpe" e "contra a Globo", ações estas aprovadas em reunião para se efetivarem em todos os estados e municípios do país, como aponta a circular n° 09 do Partido dos Trabalhadores [2]

3. No meio das disputas, uma fração do para-governismo/reformismo [3] (PSOL/RUA; UJR/PCR) demonstra o que são de verdade: Meras linhas auxiliares do governismo, prontos para defendê-los ao mínimo de 'perigo' notado. Não só em ação, mas em seus respectivos veículos de comunicação, são publicadas diretrizes de atuação de seus militantes, e em ambos, o slogan "Fora Temer" se faz presente, assim como um tímido combate aos cortes, feito na crença de que sem Michel Temer (e com eleições gerais), os cortes cessarão.   
4. Outra fração do para-governismo/reformismo (ANEL/PSTU) anula a ação do povo fora do parlamentarismo, exigindo "fora todos", com um discurso profundamente anti-governista, mas sem capacidade de extrapolar a democracia burguesa, acreditando que o problema se resolveria com "eleições gerais". Mas isso não ocorre ao acaso.
5. É importante perceber que os setores para-governistas, principalmente ANEL/PSTU e RUA/PSOL agora convocam suas militâncias para a defesa de eleições gerais. O objetivo é claro: Colocar seus candidatos à presidência no poder, usando, mais uma vez, o movimento estudantil como trampolim da política parlamentar da democracia burguesa.
6. Enquanto o debate da falsa polarização ganha força no movimento estudantil, cooptando os mais ingênuos, e dando prosseguimento às inacabadas eleições presidenciais de 2014, nosso real inimigo segue intocado: O ajuste fiscal, um conjunto de ações que tem por finalidade 'salvar a economia brasileira'. Mas é preciso lembrar: Para salvar a economia brasileira, é preciso sacrificar trabalhadores e estudantes. Isso já é visível desde o governo Lula-Dilma/PT, com a modificação de leis trabalhistas, reforma da previdência, privatização do SUS via EBSERH e do ensino via Organizações Sociais (OSs), com os cortes de aproximadamente 15 Bilhões de reais na educação, e decretando em seu último dia de mandato, o fim da bolsa-permanência nas universidades, aumento de 237,5% na prestação do Minha Casa Minha Vida para a faixa que engloba as pessoas mais pobres no programa, a oficialização da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, que dizimará indígenas da região, como já vem dizimando, e a aprovação da Lei Geral das Olimpíadas, que servirá para perseguir manifestantes no período da competição, como ocorreu com a Lei Geral da Copa, apoiada com o Manual da Garantia da Lei e da Ordem, feita pelo governo federal e exército, e que se estabeleceu com a Lei Antiterrorista. 
7. O ajuste segue com o governo Temer, que promete dar continuidade ao projeto de ajuste iniciado no governo Dilma, aplicando-o na educação, na saúde e nos direitos laborais. Ambos trabalharam e trabalham para o reaquecimento da economia nacional, assim como qualquer outro que esteja na presidência. Estão juntos também na articulação de um pacto interpartidário e nacional para salvar parlamentares de diversos partidos políticos. 
8. A tarefa dos que sabem que não é trocando de presidentes que se barra os cortes é seguir combatendo os inimigos do povo, pela via classista, combativa e pela base, longe de "pactos" com partidos, governos e empresas, organizando a luta dos estudantes secundaristas, técnicos e universitários, de públicas e particulares, sem oportunismos nem traições. 
9. Nós do Comitê de Propaganda da RECC no Piauí não oferecemos nada além da luta sincera. Não prometemos lugares no governo, nem verbas de desvio financeiro de carteirinhas. O nossa caminho é, talvez, o mais difícil a se seguir da atual conjuntura no Movimento Estudantil, mas é o único que não se vende, atado na plataforma de partidos eleitoreiros, e nem faz acordos espúrios que traem os estudantes e trabalhadores.

NOTAS:
[1] Governismo é um termo que define as organizações que se vinculam e defendem a plataforma e as táticas do governo na militância sindical, estudantil e popular. É um termo que pode entrar em desuso, dada a “nova” conjuntura da democracia burguesa no país, em caso do processo de impeachment seja de fato efetivado.
[2] Para-governismo é um termo que define as organizações que não se vinculam ao governo, mas que usam de suas táticas na militância sindical, estudantil e popular. O termo também entrará em desuso pelos mesmos motivos.
[3] Circular Nº 9 – Frente Brasil Popular – Orientações para os estados contra o golpe. < www.pt.org.br/wp-content/uploads/2016/03/Circular-09.pdf>